
fotografia por Carolina Valentim
Para manusear o silêncio
é preciso delicadeza
Munido de seus próprios sons, o silêncio não é a mera ausência de barulho, mas uma terceira via entre o excesso de sentido e a omissão. Há coisas que só se revelam sob o silêncio. E para escutá-lo é preciso aquietar a palavra, desejo difícil e improvável em nosso mundo vigilante.
Adentramos as pinturas de Greta Coutinho assim, no silêncio. Suspensos em sutileza. É preciso cuidado para não importunar as mulheres que ali parecem compartilhar, ora entre si, ora na solitude, o gesto da contemplação e da serenidade. Resta-nos, então, acalmar os humores e aceitar o convite, emudecer as palavras e juntar-nos a elas para olhar e ouvir de corpo todo.
De beleza indiscutível e vivas cores que fazem aguar a boca, o mundo em que mergulhamos através das pinturas é vibrante e carregado de brilho. Envolve-nos, pouco a pouco, e já submersos, esperamos um próximo movimento. Quem sabe, após uma pequena distração, uma das moças terá aberto seus olhos, suspirado, afrouxado um botão, gerado um outro gesto. Mas não acontece. Permanecem iguais, e agora a serenidade não anda mais só. Uma ambiguidade se insinua.
Silêncio, sono e morte coabitam. São, a um só tempo, uma janela para o idílio e para a tragédia. Enfim, o silêncio das mulheres nas telas de Greta evidencia seus sons e sua angustiante ambivalência. Quem são essas moças? O que fazem juntas? De onde ou quando elas vêm? O que dizem suas vestes? Por que estão sempre em ambiente privado? Por que parecem fundas em sono? Estariam mortas? Mortas por dentro? Em tanta beleza, onde está o feio? O que veem seus olhos virados para dentro? Ou então, se abrissem olhos, o que eles revelariam?
Mas para responder indagações e narrar a oculta história dessas mulheres, nossas palavras são ainda obsoletas. Por isso, pintura e silêncio. Greta nos leva, não para um outro tempo, como poderíamos pensar, mas para um outro idioma. Trata-se de um deslocamento de linguagem para dar contorno àquilo que está à frente da violência e dominação de nossa língua. Passado, presente e futuro coexistem em repetição. Para manusear o silêncio é preciso delicadeza, pois o silêncio é um testemunho. Nós, de olhos abertos, testemunhamos. Do lado de lá, as mulheres esperam. E esperam. E esperam.
texto por Luisa Lancellotti
. bio,
Artista plástica e ceramista, vive e trabalha em São Bernardo do Campo, SP.
Formada em Letras, pela Universidade de São Paulo (2016), em Artes Plásticas (2020), pela Escola Panamericana de Arte e Design, e pós-graduanda em Psicanálise, Arte e Literatura, pelo Instituto ESPE.
Nos últimos anos, fez parte de grupos de estudos de escrita com Ana Estaregui, Noemi Jaffe (na Escrevedeira), Angélica Freitas e Aline Bei, grupos de estudos em pintura (prática e reflexão) com Regina Parra, Paulo Pasta (no Tomie Ohtake), Anna Costa e Silva (na Escola de Artes Plásticas do Parque Lage), da comunidade Uncool Artist, do Taller Diligente (em Buenos Aires), e Aguafuerte Taller (em Santiago). Atualmente, participa do Grupo FIGAS - Grupo de Pesquisa em Feminismos, Imagens, Gêneros e Artes, da UNESP.
Em sua investigação visual, procura relacionar diferentes linguagens como pintura, escrita, vídeo e cerâmica, com a intenção de retratar temáticas que abordem a relação afetiva entre mulheres, a hereditariedade da cumplicidade feminina e a afinidade de compartilhar as angústias e o peso de habitar o corpo-mulher.
. participações,
2024, novembro, São Paulo, BR | Ocupação Artemísia
Exposição coletiva Silenciam, mas eu futuro, curada pelos Coletivos @ocupacaoartemisia @nauapi @coletivo_cuscuz com apoio do @festivalmixbrasil para a celebração da diversidade LGBTQIA+
2024, fevereiro, São Paulo, BR | Galeria Contempo
Exposição A casa, a cidade e o mar, curada por Luana Rosiello na Galeria Contempo.
2023, dezembro, São Paulo, BR | IA/UNESP
Participação na exposição coletiva (A)tração Marginal com o Grupo FIGAS - Grupo de Pesquisa em Feminismo, Imagem, Gênero, Arte e Sexualidade, no Instituto de Artes da UNESP, ocorrida em 2 de dezembro de 2023.
2023, setembro, São Bernardo do Campo, BR | Casa Syla
Convidada pela produtora cultural e curadora Vic Donatangelo para exposição individual Entrelaçar o azul na Casa Syla, em SBC, ocorrida em setembro de 2023.
2023, junho, São Paulo, BR | Galeria Contempo
Selecionada por edital para ser representada pela Galeria Contempo.
2023, junho, São Paulo, BR | 15a Grande Exposição de Arte Bunkyo
Selecionada para exposição coletiva ocorrida em outubro de 2023.
2023, maio, Goiás, BR | Salão de Arte Contemporânea de Formosa
Duas obras selecionadas pelo edital cultural de chamada pública do Instituto Federal de Goiás, para participação
de exposição coletiva na Fundação Museu Couros de Formosa, ocorrida em junho de 2023.
2023, março, São Paulo, BR | Nano Art Market
Selecionada pela curadora Daniela Avellar para compor com algumas obras o acervo do marketplace da Nano Art Market.
2022, maio, Buenos Aires, AR | Clube de Artista Defensores de Almagro - CADA
Participação em Open Studio a convite do artista Juliano Mazzuchini, membro do CADA.
2022, janeiro-fevereiro, Rio de Janeiro, BR | Espaço Cultural Correios Niterói
Exposição Pan Techné, homenagem à Semana de Arte Moderna de 22. Curadoria de Oscar D'Ambrosio e Eliana Tsuru.
. publicações,
Do luto impedido ao luto coletivo, Um caso clínico-político, fevereiro 2024
Gravura para capa a convite da autora Sandra Luzia de Souza Alencar, publicado pela Editora Blucher.
Grupo FIGAS - UNESP, 2024
Publicação de trabalho no livro (A)trações marginais: tensionando feminismos, imagens, gêneros, artes e sexualidades, edição 5 de 2024.
Victoria Ocampo e Virginia Woolf – Correspondência, fevereiro 2024
Ilustração para capa a convite da designer Cris Gu e editora Joice Nunes, publicado pela Editora Bazar do Tempo.
2023, setembro, São Paulo, BR | O Mal das Flores
Coautoria com uma série de monotipias para ilustrar o livro de poesia O Mal das Flores, de Gabriela Azevedo, publicado pela Editora Urutau.
2023, março, São Paulo, BR | Revista Pagu
Selecionada para compor a capa da revista, edição 5 de 2024, em contribuição com o pensamento feminista do Núcleo de Estudos de Gênero da UNICAMP.
2023, fevereiro, São Paulo, BR | Periódico-Periódico
Selecionada para a 1a edição da Periódico-Periódico.
2023, fevereiro, Curitiba, BR | Revista Mathilda
Selecionada para a edição Vol. 7 da Revista Mathilda.
2021, São Paulo, BR | Zaranza, da escritora Rita de Podestá, 2021
Colagem selecionada para a capa do livro Zaranza, de Rita de Podestá, lançado pela Editora Reformatório e finalista
do Prêmio Jabuti 2022.